segunda-feira, 12 de novembro de 2007

LAMENTO À COVARDIA


Mais vale eu viver a vida com dignidade e como homem, do que morrer covarde atrás de um arbusto com medo de encarar a vida.



Eu acreditei no seu portugues, no portugues das palavras, no portugues da gramática, mas descobri que você não é bom de portugues, porque você não soube usar as palavras ou elas "elas" não foram verdadeiras. Porque você não soube usar a gramática, não sabendo ao menos como empregar um ponto final.
Se sou livre para voar me pergunto:
Porque sonhei, me apaixonei, me iludi, me ceguei, me permeti, me imaginei feliz em sua gaiola como um beija-flor capturado por provar o nectar de uma flor?
Agora é tarde demais, você foi embora.
Mas o tempo sabe bem o que fazer, deixa a chuva lavar para curar a ferida que insiste em sangrar..., mas vai fechar.
Com os olhos banhados d'agua percebo como tudo é um pretexto para maquilar nossos sentimentos, nosso ego, nossos desejos, nossos medos, nossos anseios. O como eu fui um pretexto momentaneo em sua vida para seu prazer.
Olhando no espelho, só me resta o lamento. Lamento por mim, lamento por ti, pelo "amor", pela vida, pela credibilidade ou a falta dela, pela dor, pela saudade daquilo vivido e mais ainda do que não pudemos viver, porque você conseguiu assassinar um prematuro que não chegou a engatinhar. Este, você tirou do chão e brutalmente atirou ao precipício, este: O amor.
Lamento pela sua fuga covarde de não me olhar nos olhos; pela minha voz que ficou presa e que dilacera minh'alma; pela falta de persistência; pela sua falta de maturidade, consideração, carinho, respeito, dignidade, hombridade, humanidade, sinceridade que você não soube excercer.
Lamento pela sua covardia.
Lamento pela minha falta de você e por não aceitar a sua rejeição... lamento.
Hoje não mais me importam os lamentos, os arrependimentos, as palavras. Hoje não me importa o nosso amor, porque você o transformou em inútil.
Hoje cabe a mim a conformação, a aceitação, a continuidade da vida.
Hoje não sofro pela falta de amor que você deixou de me dar, sofro por ter creditado à você a pessoa que sonhei pra mim e não a pessoa que você verdadeiramente é.
Sofro pelo meu erro; porque me faltam forçar para prosseguir; porque me faltam esperanças; porque me faltam palavras; porque hoje, ao menos hoje eu não quero mais te ver. Hoje, ao menos hoje eu não tomarei minha dose de você porque esta poção é mortifera.
Sofro porque não consigo mais chorar porque as lágrimas se empedraram, restando apenas a falta de ar.
Sofro porque te "odeio".
Sofro porque sei que minha abstinência de você uma hora vai passar.
Mais sofro mais ainda por que sou eu que marcarei aquilo que você deveria ter registrado. A palavra que apartir de hoje mentalizo, pelo menos até me erguer, me desacorrentar de você, criar assas e novamente voar. Esta palavra: Fim.



Antonio Ranieri - 10/11/2007 - às 15:30

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Descompasso




Será que é amor?
Será que incomoda?
Será que resseca a boca, dói o peito, revira o estomago, ou simplesmente da náusea?
Será que faz tremer?
Vento soprado contrário.
Será que ele observa assim como uma gaivota por entre as rochas a beira mar?
Que sonha e divaga como os poetas regados a álcool, rei das calçadas do Centro?
Será que ele tem os olhos cintilantes?
Que é homem?
Mulher?
Bicho?
Flor?
Será que é possível?
Será que é mito?
Novela?
Alegria?
Bicicleta geminada?
Mouse de maracujá levado à boca de aviãozinho?
Eta menino mimado!
Será que ele é pleno, infinito, eterno e justo?
Será que ele ri ou torce o nariz?
Cara torta.
Monalisa descompassada de algum Leonardo Divino.
Rouxinol aveludado na soleira da porta da casa da avó.
Será que ele é energia?
Será que ele brilha?
Será que ele existe?
E se não existe o que será o amor?
E se não for amor?
Que será esse bichinho gostoso remoendo lá dentro que emociona e subverte aos gracejos de um sorriso?
Falta de eixo.
“MALEMOLÊNCIA” ritmada dos ossos.
Cobertor de orelha.
Corpos desnudos no algodão branquinho.
Saudade interminável mesmo pertinho, que de tão pertinho me sinto pequenino.
Vontade de me fazer menino para ser protegido pelos seus braços rijos.
Prazer de ter você ao meu lado enquanto Orpheu entorpecido e “Báquico” , ritualisticamente nos encanta, e nos protege.
Mas se não for amor?
Se não for amor, então eu não me importo mais com o amor, não o conheço, não o quero e nem tão pouco passarei minha vida a procurá-lo.
Porque hoje é assim que sou FELIZ.
Mesmo sem saber se isso é amor! Amor!
Hoje sou feliz,
Feliz como um menino-homem, serelepe e ingênuo,
Que surpreso sorri ao ganhar o tão sonhado presente de natal.


14/09/2007

sexta-feira, 6 de julho de 2007

pelo suor



Pelo suor escorriam aquelas que não podiam descer pelos meus olhos.
Pelo suor passava tudo àquilo que se retorcia em meu ser.
Pelo suor eu sentia meu corpo desinchado, à medida que minha alma pendia cada vez mais.
Pelo suor eu tentava me libertar do que me sufocava.
Como um lapso meu corpo pulava sem controle.
Como um louco corria sem rumo, sem estrada e sem objetivo.
Barulhos distorcidos, quase grunhidos de seres fortemente apáticos e robotizados.
Uma hélice estridente como uma gralha destrambelhada, dava a todos uma sensação de alívio.
E eu, ali, compulsivamente deslizando numa borracha negra, rumo a lugar nenhum. Na medida em que meus pensamentos se perdiam em longos caminhos negros, longos caminhos obscuros e desconhecidos.
Entre dentes me pegava e em ódio eu me vi...
Gritando à medida que o saco de areia pedia que ali jogasse toda a minha raiva.
Os socos, os chutes foram tantos e tão fortes que de repente um, dois, três, diversos furos fizeram escorrer uma areia fina e amarelada, dando ao salão um aspecto quase praiano.
Meu abdômen, minha coluna, minhas pernas, o que mais trabalhar?
O que??
E ainda sim meus pensamentos ferrenhos permaneciam.
E ainda sim minha ulcera que me consumia.
E novamente percebi que pelo suor escorriam minhas lástimas, minhas dores, meus anseios, meus pecados e meus medos.
Pelo suor novamente expus meu sofrimento. Um suor forte, uma gordura com cheiro forte, uma ânsia, um desespero, um grito, um gemido e uma barra de ferro a minha frente esperando ansiosa que ali prosseguisse na minha consumição alucinógena a espera ácida de mais uma gota de suor.


Antonio Ranieri
21/04/2006

quinta-feira, 28 de junho de 2007

LUZ


Por hoje não vejo a luz.
Pelo menos por hoje não vejo a luz.

Hoje o dia amanheceu cinza.
A neblina pairou e parou.
A névoa envolve o fofo corpo coberto.
Mas não cobre a cabeleira raspada.
Espirro!
Por hoje não vejo a luz.

Corrida em vão.
Esteira elétrica sem destino.
Suor, cansaço, desgaste.
Casto, engulo seco o sapo gelatinoso.
Incredulidade.
Por hoje não vejo a luz.

Números, códigos de barra, robô sem voz.
Inexpressivo.
Apático.
Permaneço.
Estouro
Por hoje não vejo a luz.

No ouvido, o resquício fresco das vozes dissonantes.
Na boca, gengivas menstruadas.
Nos olhos a exaustão.
Na voz a fúria da repetição.
Ventríloquo da globalização.
Por hoje não vejo a luz

Dos olhares, o olhar errado.
Dos beijos a boca errada.
Das carícias o corpo errado.
Dos sonhos, o cenário errado.
Do poeta gauche
A certeza da incerteza de mais um dia.
Por hoje não vejo a luz.

A casa:de chocolate.
O carrinho: que bate bate.
O animal de estimação: de pelúcia
O romance: da novela.
A felicidade: dos livros de auto-ajuda.
O sonho: da padaria.
A história: de contos de fadas.
Utopia.
Por hoje não vejo a luz.
Pelo menos por hoje não vejo a luz.

Porque a vela se apagou?

A vela do bolo de um ano,
Não ilumina como antes.
A da primeira comunhão se quebrou.
A da crisma não existiu.
A do casamento nem existe.
E nos aniversário da velhice.
As velas foram esquecidas.
Apenas o bolo c/ glacê branco amarelado.
Serotonina aos marginalizados.

Acabou a luz.
Nem lamparina, nem lampião.
Nem tocha, nem fogueira.
Nem isqueiro, nem lanterna
Nem o fósforo esquecido no fundo da gaveta.
Acabou a luz.

Acabou a luz, porque acabou a fé.
Porque acabou a esperança.
Porque não adianta mais sonhar
Porque os sonhos não se realizam.
Acabou a luz porque o homem desconhece a palavra carinho.
Porque o carinho resultou em fast-food sexual.
Acabou a luz porque acabou o amor.
E acabando o amor, acaba a energia.
A mesma energia que me faz cantar,
Representar,
Pintar
Sonhar
Brincar.
Viver.
Hoje não há razão de viver.
Pelo menos por hoje não há razão de viver
Porque hoje não vejo a luz.
Pelo menos por hoje não vejo a luz.

Antonio Ranieri
27/06/2007

sexta-feira, 22 de junho de 2007

PEROLA NEGRA


Difícil é não reparar quando ela passa.
As flores sorriem
Os pássaros cantam
Os homens se curvam
E as mulheres paralisam

É toda presença.

Tenta disfarçar-se em meio a trajes negros
Camufla-se
Mas sem perceber, desfila.
O seu sorriso tem um alcance maior que as parabólicas.
Irradia

Da cabeça cabeleira raspada
Nasce brotinhos de um novo ser
Aos poucos se transforma
Agora com 3 “ponto” 0 um novo caminho
Novas perspectivas apontam um horizonte mais colorido

Sabes pintar o rosto, enfeitiça crianças.
Colori o espírito
Sabes dar a mão sem pedir
Abraçar e sentir
Conforto fofo como uma cama de algodão

Moleca,tropeça, trupíca.
Cambaleia, carambola, cambalhota.

Menina

Das meiguices de criança
Uma mulher imcomparável.

Um foco
Um gesto
Uma voz
Um tom
Aplausos

A atriz encanta, canta, cantarola
Sabes como é rico a profissão que tem
É dom, é verdade, é trabalho.
Passa a mensagem aos olhos arregalados com sua representação.
Sabe que é possível, acredita que as coisas “MUDI”.



Mas tem temperamento ácido.
É instável
Como o tempo de São Paulo, muda de fases.
Surpreende, assusta, impressiona.
Explode se necessário.

Como um gato:
Arranha
Observa
Seduz
E ataca.

É geminiana, é fato.

Mas é delicada.
Frágil, uma pedra preciosa.
Perola Negra
Embrulhada num pequeno pano de camurça
A escondo no cantinho falso da minha caixinha de madeira.



Antonio Ranieri
20/06/2007

terça-feira, 19 de junho de 2007

PALCO




Inusitado aqui, encontro estrelas adormecidas que há muito estão guardadas no baú da ilusão.
Meninos e meninas boquiabertos se encontram depois do primeiro embate.
Cachos, tranças, carecas arrepiadas, barriguinhas torneadas de um tronco acebolado.
Olhos;
Bocas;
Tesão escondido;
Sonho reprimido;
O estágio definitivo de uma descoberta maior.
Não queremos, queremos, o se queremos.
Quero-quero de um jogo de luzes pitorescas, e coloridas, na boca de cena do palco da vida.



Antonio Ranieri
24/04/2006

segunda-feira, 11 de junho de 2007

EXPLOSÃO





Meu coração vai explodir.
Sinto você me encarando, me sugando, me tirando, me matando.
Por um milésimo de segundo me arrependi;
Não queria seu olhar em mim.
Quero fugir, mas é tarde de mais.
Seu olhar sincero
No seu olhar me quero.
Seu olhar no meu olhar.
Meu olhar no seu olhar.
Dois olhares num só.
Sem preconceito, sem medo, sem força para reagir.Quieto no meu canto faminto, rugindo, cuspindo, me sinto bonito, punido, banido, perseguido, comprimido e prestes a explodir

terça-feira, 5 de junho de 2007

AOS AMIGOS


Lembro-me como se fosse hoje do João Bobo, um boneco de ar, com peso no fundo, que eu menino ficava socando inúmeras vezes para que ele caísse. Mas o boneco foi planejado justamente para fazer o oposto, sempre voltar com o mesmo impulso de que foi arremessado.
No dia de hoje, triste, amargurado, frio, lembro da casa velha da minha avó, casinha de barro rústica, mas aconchegante, como todas as casas das avós. Isso me bateu a recordação dos dias que ficava todo cheio de roupas de lã socando o bom e velho AMIGO João Bobo.
Foi num dia cinza, como hoje, que a solidão tocou minha campainha . E eu desprevenido, não consultei o olho mágico e abri a porta todo receptivo a ela, “a solidão”, que entrou fagueira, serelepe e sarcástica, olhando nos meus olhos sorriu, pois viu no fundo de minha alma o momento cume de minha fragilidade.
Ali parado de frente para ela, senti cada parte do meu corpo pulsando, começou nos pés e subiu vagarosamente. No estômago a náusea foi tão forte que não me contive e coloquei pra fora: um copo de água, um danone com flocos de chocolate, duas tangerinas e um pedaço de pizza adormecido, tudo que havia consumido durante o dia. Quando chegou perto na região do peito, percebi que o meu coração já não pulsava, ele saltava como um campeão de olimpíadas; e quando esta força tomou a região do meu rosto, senti que meus olhos começaram a marejar, eu ali de frente para ela, a encarei com todas as minhas forças, e as lágrimas salgadas que sonhavam em deslizar pela minha face, se empedraram uma a uma e formaram uma enorme barreira em volta da menina dos meus olhos.
Sinto que aquele João Bobo, o mesmo de minha infância, está cada vez mais perto de mim, às vezes me sinto o próprio, como se eu fosse socado de um lado, de outro, e sempre, todas às vezes voltando ao ponto inicial à espera certa de um novo golpe para eu me movimentar.
Hoje sinto que aqueles que me socam, por ironia do destino são os mesmo que se intitulam meus amigos, os mesmos que dizem me amar e se importar comigo. Sei que a generalização incomoda os inocentes, mas sei também que os não culpados sabem em não ligar para as minhas divagações.
Por muito tempo chorei, falei mal, gritei, esperneei, sempre procurando entender o que se passava nas cabeças dessas pessoas. Sempre a cada soco, eu ficava lá deitadinho, imóvel por um tempo com receio de me levantar e levar mais um knock-down. Mas sempre acabava me levantando.
Hoje sinto que começa um novo ciclo, uma nova fase, um ponto e vírgula na minha vida. Um pouco consciente, um pouco forçado, um pouco só, sinto apenas em não ter com quem desfrutar. Sinto apenas em ter transformado o pobre João bobo, num lutador voraz, com sede de justiça, com vontade própria, com sonhos e ideais. Cansado de tanto ser levado à lona, me levanto mais uma vez, só que agora com um diferencial, armado de um par de luvas de boxe que uma amiga muito querida e fiel me deu com o tempo, a vida. Esta luva, no entanto está apenas para me defender dos “amigos”, os mesmos que me beijam e me socam, os mesmo que várias vezes me deixaram com o rosto inchado, sangrando e melado de lágrimas. Os mesmo que admiro que amo, que sinto que fazem parte de mim e mesmo assim me dilaceram.
Em ataque! Eu João bobo, gingo como Muhamad Ali, me preparo para não ser mais nocauteado. Ergo-me e ouço nitidamente o sino que dá início a mais um round.
Antonio Ranieri

22/05/2006

quinta-feira, 24 de maio de 2007

A menina dos Olhos



Chega um momento na vida em que a mudança por mais árdua é necessária.
No auge da minha adolescência descobri o significado da palavra metamorfose, talvez por ter jogado em um time de “futebol” com este nome, time este que eu não fazia muito, a não ser ficar controlando todos que nem loucos que ali corriam de um lado para o outro atrás de uma bola. Muito tempo depois descobri que “isto” chamava-se “técnico”. Ou ainda por ter crescido ouvindo Raul Seixas, compositor que se tornou o meu favorito durante anos, que não por coincidência era o mais ouvido pela minha tia, aquela que na infância foi a mais querida.
Extrapolar limites, gritar, escrever, enfurecer, xingar, chorar, sorrir, subir na laje, contemplar a vista, mudar o lado da meia na gaveta soturna que guarda-roupa.
Entre pétalas de rosas, eu exalava o meu lado de homem, rústico de família e de tradição. E entre flores das mais variadas eu me perdia. Ali os meus pensamentos divagavam, nunca pensava tanto quanto nos sábados que fica envolto de flores e plantas, tomando chá verde retirado de uma garrafa térmica vermelha.
Momentos de descobertas e de confusões, de fios distorcidos na maquina eletroencefálica do meu mundo utópico e insamente puro.
Mas foram elas, as rosas, foram elas que me acolheram, confortaram, ouviram minhas lamurias e meus desejos. As rosas foram amigas, pois brilhavam ao me redor exalando um perfume gostoso, enchendo os meus olhos de uma beleza que até então eu desconhecia, aguçando os meus sentidos.
Não sei bem se foi entre a rosa vermelha e a orquídea, ou entre a policéntia e a petúnia, mas lembro perfeitamente a primeira vez que eu vi. Com uma bela coroa de peperômia mista, com dois coqueiros um de cada lado, tipo palmeiras, enormes que tinha chegado naquela manhã do Ceasa. Assim em close eu vi a sua menina dos olhos. Tão verde-azulado que poderia também ser azul-esverdeado. Um sorriso tão singelo como gloxínia rosada. E os dentes brancos como uma celissa.
Catatônico, tentei praticar a minha simpatia. Fixado em seus olhos, eu pegava aleatoriamente a mercadoria que sorridente me entrega: Braços rijos como os da hera.
Ponteiros dançavam ritmados por uma balada bucólica.
Levado eu fui a um campo de girassóis, onde pude ver em meio aquela beleza um anjo, ou um querubim, um pequeno contorno de Botero que cantava uma melodia triste, som que deslizava pelos seus lábios e me envolvia como os ventos de outono.
Quando me aproximei não acreditei no que eu via, aquele anjo tinha os meus traços, como se fosse uma miragem, ou uma projeção minha enquanto menino, mas não era eu, era uma outra criança, e eu só percebi isso quando vi que seus olhos eram verde-azulados, que facilmente poderiam ser confundidos com azul-esverdeados. Só então percebi que aquele pequeno menino era um fruto, o resultado da união minha, com a visão que estava a minha frente.
Novamente eu estava envolto de flores e plantas, numa redoma de madeira de 5metros retangulares, embrulhando - as, que aqueles braços “rijos como hera” me entregava.
Pude então perceber a armadilha que minha mente havia me empregado. Colocando-me em atrito com minhas vontades e limites. Com os meus desejos e incapacidade física. Com meu desejo de homem fiquei, sonhado com o impossível ou tentando reverter à genética, como se pudesse fazer a cachoeira correr contrário, ou como se fosse capaz de fazer brotar uma flor ou um querubim, através da união de dois pares de braços rijos como a planta hera.
Antonio Ranieri
04/07/2006

segunda-feira, 21 de maio de 2007

O REFLEXO DO MAR


O reflexo solar que bateu na minha janela, não se sabe por qual razão se escondeu.
O dia cinza contrasta com o verde da grama.
O barulho do mar se confunde com a poluição sonora trazidas pra cá.
A liberdade, ou esta sensação, perde a força ao ver tantos muros e grades a minha volta.
O choro não caiu.
A risada não fluiu.
A conversa nunca existiu.
O homem se feriu e eu aqui preocupado com o meu umbigo.
Quanta covardia meu Deus!
Abrisa é forte e só mesmo Yemanjá pra tomar conta de mim.


Antonio Ranieri
04/11/2006

quarta-feira, 16 de maio de 2007

SE


Estava eu atuando e depois de tantos sinais que a mim apontavam como uma lanterna com defeito, mais parecendo um pisca alerta, tive uma sensação estranha e de repente me vi no papel do espectador.
Por um momento apreciei a minha atuação, como se fosse capaz de estar em dois lugares ao mesmo tempo.
Um gesto, um sorriso, um afago, um carinho, uma palavra...; silencio.
Bochechas rubras!
Um suspiro e uma descoberta, um pequeno e transformador detalhe que o público achava que sabia, ou supunha que existia, agora eu também via. Parei!
Hesitei.
Me excitei, sorri envergonhadamente e em seguida enfureci.
Gritei, berrei, urrei, chorei, chorei, chorei, relaxei e dormi.
Uma pausa, um intervalo, um final de semana, a separação entre dois atos.
Mas quando as cortinas reabriram, eu estava ali, e já não mais me reconhecia. Agora eu via o meu desejo refletido nas meninas dos olhos dos espectadores que tanto me alertavam e isso me assustava.
Emudeci.
Sem graça e sem palavras, hoje a coisa que mais me incomoda é: Se?

Antonio Ranieri
15/05/2007

terça-feira, 15 de maio de 2007

PARTO





Cansado, depois de mais um dia exaustivo de trabalho, deitei em minha cama na tentativa desesperada de relaxar. Senti que dentro de mim algo pulsava descontroladamente e minha cabeça já não conseguia mais controlar os movimentos do meu corpo.
Eu suava, tremia e meus pensamentos, os mais pitorescos e surrealistas deslizavam em flashs em minha mente.
Sem perceber sentado em minha cama um espectro da minha angustia sorria complacente com o meu sofrimento e na porta de saída lá estava ela, fria, com seus olhos de lince e com os braços abertos na espera em que eu me desligasse para poder amparar-me em teu colo. Prefiro não dizer teu nome.
As dores aumentavam com tal intensidade, que já não mais existia concentração para preces. Nem tão pouco consegui me apegar as crendices que aprendi quando menino, como aquela que eu ficava deitado com uma almofada em baixo das costas e a minha avó com suas mãos enrugadas, passava um óleo morno em minha barriga, acreditando que tiraria de mim o sofrimento momentâneo, e o engraçado é que ela conseguia.
De repente percebi que minhas colchas verdes, já não eram verdes, e nem tão pouco colchas. Deitado na grama verde vermelho sangue, percebi que em volta de mim tudo já não era igual, os espectros tinham desaparecidos e ao longe eu ouvia uma sirene que provavelmente seria de uma ambulância, cujo um vizinho gordo, de tanto ouvir minhas lamurias devia ter chamado.
Um momento de paz, um segundo e o silêncio. Olhos entre abertos, boca fria, suor e medo. Num piscar de olhos a minha frente, como se tivesse sido expelido do meu ventre, o que Deus não me agraciou, um rebento de quinze metros e cinco toneladas me espreitava. Cada cabeça um rosto, cada rosto um semblante. Dor, medo, solidão, angústia, todas me encaravam a espera que eu as acolhesse em meu peito e nutrisse com liquido sagrado capaz de lhe darem finalmente a vida.
Eu confesso que neguei, mesmo elas vindo em minha direção, me sugando feito morcegos na seca, lutei bravamente na espera que conseguisse ficar em pé. Feito a obra do “Munch” percebi minha imagem refletida no campo.
Rendi-me e deixei meu corpo esmorecer. A grama envolvendo meu corpo, e no céu despontava uma meia luz dando margem aos soturnos uma visão aterrorizante do meu sacrifício.
Um cheiro de comida, uma lembrança de infância, uma reza em uma estrofe e um anjo suspirando ao meu ouvido. Com uma força sobrenatural consegui me debater, quase entrando num transe sem volta. Consegui encarar aquele monstro com cabeças e sentimentos, e como uma cadela que come seus filhotes mortos, coloquei cada um para dentro de mim novamente. Com muitas lágrimas expurguei-os da minha vista, mas importei cada um para o meu peito. Ali se debatendo, todos ansiosos, esperam o momento em que sairão de novo e finalmente me entregarão feito um sacrifício a ela que sorridente me levará em seu colo.


Antonio Ranieri – 04/04/2007

sexta-feira, 11 de maio de 2007

A inauguração

A idéia desse blog nasceu da necessidade de abrir mais um espaço para divulgar idéias, textos, críticas, crônicas, opiniões e quaisquer outra forma de manifestação. Muitas coisas que não podemos ou não temos espaço para falar. Abaixo um texto inaugural do maior poeta do Mundo:
Ranieri

Os ombros suportam o mundo
Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.Tempo de absoluta depuração.Tempo em que não se diz mais: meu amor.Porque o amor resultou inútil.E os olhos não choram.E as mãos tecem apenas o rude trabalho.E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.Ficaste sozinho, a luz apagou-se,mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.És todo certeza, já não sabes sofrer.E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?Teus ombros suportam o mundoe ele não pesa mais que a mão de uma criança.As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifíciosprovam apenas que a vida prossegee nem todos se libertaram ainda.Alguns, achando bárbaro o espetáculo,prefeririam (os delicados) morrer.Chegou um tempo em que não adianta morrer.Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.A vida apenas, sem mistificação.

Carlos Drummond de Andrade