quinta-feira, 28 de junho de 2007

LUZ


Por hoje não vejo a luz.
Pelo menos por hoje não vejo a luz.

Hoje o dia amanheceu cinza.
A neblina pairou e parou.
A névoa envolve o fofo corpo coberto.
Mas não cobre a cabeleira raspada.
Espirro!
Por hoje não vejo a luz.

Corrida em vão.
Esteira elétrica sem destino.
Suor, cansaço, desgaste.
Casto, engulo seco o sapo gelatinoso.
Incredulidade.
Por hoje não vejo a luz.

Números, códigos de barra, robô sem voz.
Inexpressivo.
Apático.
Permaneço.
Estouro
Por hoje não vejo a luz.

No ouvido, o resquício fresco das vozes dissonantes.
Na boca, gengivas menstruadas.
Nos olhos a exaustão.
Na voz a fúria da repetição.
Ventríloquo da globalização.
Por hoje não vejo a luz

Dos olhares, o olhar errado.
Dos beijos a boca errada.
Das carícias o corpo errado.
Dos sonhos, o cenário errado.
Do poeta gauche
A certeza da incerteza de mais um dia.
Por hoje não vejo a luz.

A casa:de chocolate.
O carrinho: que bate bate.
O animal de estimação: de pelúcia
O romance: da novela.
A felicidade: dos livros de auto-ajuda.
O sonho: da padaria.
A história: de contos de fadas.
Utopia.
Por hoje não vejo a luz.
Pelo menos por hoje não vejo a luz.

Porque a vela se apagou?

A vela do bolo de um ano,
Não ilumina como antes.
A da primeira comunhão se quebrou.
A da crisma não existiu.
A do casamento nem existe.
E nos aniversário da velhice.
As velas foram esquecidas.
Apenas o bolo c/ glacê branco amarelado.
Serotonina aos marginalizados.

Acabou a luz.
Nem lamparina, nem lampião.
Nem tocha, nem fogueira.
Nem isqueiro, nem lanterna
Nem o fósforo esquecido no fundo da gaveta.
Acabou a luz.

Acabou a luz, porque acabou a fé.
Porque acabou a esperança.
Porque não adianta mais sonhar
Porque os sonhos não se realizam.
Acabou a luz porque o homem desconhece a palavra carinho.
Porque o carinho resultou em fast-food sexual.
Acabou a luz porque acabou o amor.
E acabando o amor, acaba a energia.
A mesma energia que me faz cantar,
Representar,
Pintar
Sonhar
Brincar.
Viver.
Hoje não há razão de viver.
Pelo menos por hoje não há razão de viver
Porque hoje não vejo a luz.
Pelo menos por hoje não vejo a luz.

Antonio Ranieri
27/06/2007

sexta-feira, 22 de junho de 2007

PEROLA NEGRA


Difícil é não reparar quando ela passa.
As flores sorriem
Os pássaros cantam
Os homens se curvam
E as mulheres paralisam

É toda presença.

Tenta disfarçar-se em meio a trajes negros
Camufla-se
Mas sem perceber, desfila.
O seu sorriso tem um alcance maior que as parabólicas.
Irradia

Da cabeça cabeleira raspada
Nasce brotinhos de um novo ser
Aos poucos se transforma
Agora com 3 “ponto” 0 um novo caminho
Novas perspectivas apontam um horizonte mais colorido

Sabes pintar o rosto, enfeitiça crianças.
Colori o espírito
Sabes dar a mão sem pedir
Abraçar e sentir
Conforto fofo como uma cama de algodão

Moleca,tropeça, trupíca.
Cambaleia, carambola, cambalhota.

Menina

Das meiguices de criança
Uma mulher imcomparável.

Um foco
Um gesto
Uma voz
Um tom
Aplausos

A atriz encanta, canta, cantarola
Sabes como é rico a profissão que tem
É dom, é verdade, é trabalho.
Passa a mensagem aos olhos arregalados com sua representação.
Sabe que é possível, acredita que as coisas “MUDI”.



Mas tem temperamento ácido.
É instável
Como o tempo de São Paulo, muda de fases.
Surpreende, assusta, impressiona.
Explode se necessário.

Como um gato:
Arranha
Observa
Seduz
E ataca.

É geminiana, é fato.

Mas é delicada.
Frágil, uma pedra preciosa.
Perola Negra
Embrulhada num pequeno pano de camurça
A escondo no cantinho falso da minha caixinha de madeira.



Antonio Ranieri
20/06/2007

terça-feira, 19 de junho de 2007

PALCO




Inusitado aqui, encontro estrelas adormecidas que há muito estão guardadas no baú da ilusão.
Meninos e meninas boquiabertos se encontram depois do primeiro embate.
Cachos, tranças, carecas arrepiadas, barriguinhas torneadas de um tronco acebolado.
Olhos;
Bocas;
Tesão escondido;
Sonho reprimido;
O estágio definitivo de uma descoberta maior.
Não queremos, queremos, o se queremos.
Quero-quero de um jogo de luzes pitorescas, e coloridas, na boca de cena do palco da vida.



Antonio Ranieri
24/04/2006

segunda-feira, 11 de junho de 2007

EXPLOSÃO





Meu coração vai explodir.
Sinto você me encarando, me sugando, me tirando, me matando.
Por um milésimo de segundo me arrependi;
Não queria seu olhar em mim.
Quero fugir, mas é tarde de mais.
Seu olhar sincero
No seu olhar me quero.
Seu olhar no meu olhar.
Meu olhar no seu olhar.
Dois olhares num só.
Sem preconceito, sem medo, sem força para reagir.Quieto no meu canto faminto, rugindo, cuspindo, me sinto bonito, punido, banido, perseguido, comprimido e prestes a explodir

terça-feira, 5 de junho de 2007

AOS AMIGOS


Lembro-me como se fosse hoje do João Bobo, um boneco de ar, com peso no fundo, que eu menino ficava socando inúmeras vezes para que ele caísse. Mas o boneco foi planejado justamente para fazer o oposto, sempre voltar com o mesmo impulso de que foi arremessado.
No dia de hoje, triste, amargurado, frio, lembro da casa velha da minha avó, casinha de barro rústica, mas aconchegante, como todas as casas das avós. Isso me bateu a recordação dos dias que ficava todo cheio de roupas de lã socando o bom e velho AMIGO João Bobo.
Foi num dia cinza, como hoje, que a solidão tocou minha campainha . E eu desprevenido, não consultei o olho mágico e abri a porta todo receptivo a ela, “a solidão”, que entrou fagueira, serelepe e sarcástica, olhando nos meus olhos sorriu, pois viu no fundo de minha alma o momento cume de minha fragilidade.
Ali parado de frente para ela, senti cada parte do meu corpo pulsando, começou nos pés e subiu vagarosamente. No estômago a náusea foi tão forte que não me contive e coloquei pra fora: um copo de água, um danone com flocos de chocolate, duas tangerinas e um pedaço de pizza adormecido, tudo que havia consumido durante o dia. Quando chegou perto na região do peito, percebi que o meu coração já não pulsava, ele saltava como um campeão de olimpíadas; e quando esta força tomou a região do meu rosto, senti que meus olhos começaram a marejar, eu ali de frente para ela, a encarei com todas as minhas forças, e as lágrimas salgadas que sonhavam em deslizar pela minha face, se empedraram uma a uma e formaram uma enorme barreira em volta da menina dos meus olhos.
Sinto que aquele João Bobo, o mesmo de minha infância, está cada vez mais perto de mim, às vezes me sinto o próprio, como se eu fosse socado de um lado, de outro, e sempre, todas às vezes voltando ao ponto inicial à espera certa de um novo golpe para eu me movimentar.
Hoje sinto que aqueles que me socam, por ironia do destino são os mesmo que se intitulam meus amigos, os mesmos que dizem me amar e se importar comigo. Sei que a generalização incomoda os inocentes, mas sei também que os não culpados sabem em não ligar para as minhas divagações.
Por muito tempo chorei, falei mal, gritei, esperneei, sempre procurando entender o que se passava nas cabeças dessas pessoas. Sempre a cada soco, eu ficava lá deitadinho, imóvel por um tempo com receio de me levantar e levar mais um knock-down. Mas sempre acabava me levantando.
Hoje sinto que começa um novo ciclo, uma nova fase, um ponto e vírgula na minha vida. Um pouco consciente, um pouco forçado, um pouco só, sinto apenas em não ter com quem desfrutar. Sinto apenas em ter transformado o pobre João bobo, num lutador voraz, com sede de justiça, com vontade própria, com sonhos e ideais. Cansado de tanto ser levado à lona, me levanto mais uma vez, só que agora com um diferencial, armado de um par de luvas de boxe que uma amiga muito querida e fiel me deu com o tempo, a vida. Esta luva, no entanto está apenas para me defender dos “amigos”, os mesmos que me beijam e me socam, os mesmo que várias vezes me deixaram com o rosto inchado, sangrando e melado de lágrimas. Os mesmo que admiro que amo, que sinto que fazem parte de mim e mesmo assim me dilaceram.
Em ataque! Eu João bobo, gingo como Muhamad Ali, me preparo para não ser mais nocauteado. Ergo-me e ouço nitidamente o sino que dá início a mais um round.
Antonio Ranieri

22/05/2006