terça-feira, 15 de maio de 2007

PARTO





Cansado, depois de mais um dia exaustivo de trabalho, deitei em minha cama na tentativa desesperada de relaxar. Senti que dentro de mim algo pulsava descontroladamente e minha cabeça já não conseguia mais controlar os movimentos do meu corpo.
Eu suava, tremia e meus pensamentos, os mais pitorescos e surrealistas deslizavam em flashs em minha mente.
Sem perceber sentado em minha cama um espectro da minha angustia sorria complacente com o meu sofrimento e na porta de saída lá estava ela, fria, com seus olhos de lince e com os braços abertos na espera em que eu me desligasse para poder amparar-me em teu colo. Prefiro não dizer teu nome.
As dores aumentavam com tal intensidade, que já não mais existia concentração para preces. Nem tão pouco consegui me apegar as crendices que aprendi quando menino, como aquela que eu ficava deitado com uma almofada em baixo das costas e a minha avó com suas mãos enrugadas, passava um óleo morno em minha barriga, acreditando que tiraria de mim o sofrimento momentâneo, e o engraçado é que ela conseguia.
De repente percebi que minhas colchas verdes, já não eram verdes, e nem tão pouco colchas. Deitado na grama verde vermelho sangue, percebi que em volta de mim tudo já não era igual, os espectros tinham desaparecidos e ao longe eu ouvia uma sirene que provavelmente seria de uma ambulância, cujo um vizinho gordo, de tanto ouvir minhas lamurias devia ter chamado.
Um momento de paz, um segundo e o silêncio. Olhos entre abertos, boca fria, suor e medo. Num piscar de olhos a minha frente, como se tivesse sido expelido do meu ventre, o que Deus não me agraciou, um rebento de quinze metros e cinco toneladas me espreitava. Cada cabeça um rosto, cada rosto um semblante. Dor, medo, solidão, angústia, todas me encaravam a espera que eu as acolhesse em meu peito e nutrisse com liquido sagrado capaz de lhe darem finalmente a vida.
Eu confesso que neguei, mesmo elas vindo em minha direção, me sugando feito morcegos na seca, lutei bravamente na espera que conseguisse ficar em pé. Feito a obra do “Munch” percebi minha imagem refletida no campo.
Rendi-me e deixei meu corpo esmorecer. A grama envolvendo meu corpo, e no céu despontava uma meia luz dando margem aos soturnos uma visão aterrorizante do meu sacrifício.
Um cheiro de comida, uma lembrança de infância, uma reza em uma estrofe e um anjo suspirando ao meu ouvido. Com uma força sobrenatural consegui me debater, quase entrando num transe sem volta. Consegui encarar aquele monstro com cabeças e sentimentos, e como uma cadela que come seus filhotes mortos, coloquei cada um para dentro de mim novamente. Com muitas lágrimas expurguei-os da minha vista, mas importei cada um para o meu peito. Ali se debatendo, todos ansiosos, esperam o momento em que sairão de novo e finalmente me entregarão feito um sacrifício a ela que sorridente me levará em seu colo.


Antonio Ranieri – 04/04/2007